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OAB/UBÁ> Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero da 30.ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil de Minas Gerais envia nota de esclarecimento para Vereadores(as) ubaenses

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Foi lido na sessão ordinária da Câmara Municipal de Ubá, nessa segunda-feira(20/09), uma nota de esclarecimento escrita através do advogado Nathan Machado Paschoalino — Presidente da Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero da 30.ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil de Minas Gerais.

A manifestação se deu após fala da vereadora Aline Melo, na tribuna, após se envolver em uma confusão com uma postagem nas redes sociais. (Matéria aqui).

 

NOTA DE ESCLARECIMENTO

 

“A Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero da 30ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil de Minas Gerais vem, por meio dessa Nota de Esclarecimento, elucidar alguns pontos que não ficaram claros na sessão que aconteceu neste plenário dessa Câmara Municipal de Ubá na última segunda-feira, dia 13 de setembro de 2021.

Primeiramente, esta Comissão cumprimenta o Senhor Presidente e demais Vereadores e agradece o espaço cedido, pois, assim como os Senhores, acredita no diálogo que a Democracia brasileira nos permite para tal. Par elucidar este documento, nos valemos dos ensinamentos do professor, educador e filósofo Paulo Freire, respeitado e saudado mundialmente, ainda mais pelo seu centenário comemorado na data de ontem, dia 19 de setembro de 2021. São quatro pontos que serão abordados a seguir que compõem alguns de seus ensinamentos, que por mais que tenham ocorrido no século passado ainda são atuais.

 

PRIMEIRO PONTO: A importância de compreender a realidade

Acreditamos que todos os membros deste mandato nessa Casa do Povo tenham suas sexualidades, identidades e expressões de gênero muito bem definidas, porém não conseguem sentir na pele como é ser um membro da Comunidade LGBTQIA+. Tudo que passamos na nossa jornada nesta vida não é fácil. A luta para sermos respeitados é diária. A rejeição, velada e não velada, pela sociedade é um ponto que temos que sobreviver todos os dias. As nossas competências, tanto para o trabalho quanto acadêmicas, são colocadas em xeque o tempo todo, só porque não nos encaixamos nos moldes heterossexuais e nos gêneros binários. Políticas públicas devem acontecer sim, já que o tradicionalismo não nos permite viver o que somos e quem somos nas engrenagens da sociedade.

SEGUNDO PONTO: A formação de cidadãos críticos

Todos nós sabemos que a Educação é o pilar central da nossa sociedade. Sem educação, não cumpriremos os mandamentos da nossa bandeira, símbolo da República, que diz “Ordem e PROGRESSO”. Para sermos cidadãos brasileiros, temos que acreditar na Educação, na Ciência e sermos progressistas para cumprir nosso mandamento patriótico. Pensamentos conservadores, que é justamente o contrário de progressista, não podem galgar posições para impor o que deve fazer parte da nossa sociedade. Como cidadãos críticos, temos uma obrigação com o nosso país. E é justamente essa obrigação que deu ensejo à nossa jovem Democracia. Este espaço, nesta Casa, é de suma importância para educarmos, fiscalizarmos e fazer valer Políticas Públicas importantes para alcançar a Justiça Social que nossa Constituição celebra nos seus mais de 150 artigos, além dos nossos Tratados Internacionais.

 

TERCEIRO PONTO: O Combate às fake news

Obviamente que o professor Paulo Freire não disse com essas palavras, mas como existe universalismo em seus ensinamentos, podemos adequar para o presente. Ele pregava que a Educação deveria ser um processo bilateral, em que o professor também “é um aluno”. É um combate à ideia da educação tradicional, em que o docente ensina e o os estudantes são “receptáculos vazios” que apenas escutam o que é dito. Todos nós, como cidadãos críticos, quando deparamos com falas ou proposições que não decorrem do PONTO PRIMEIRO desta Nota, ou seja, da realidade, devemos reagir e não aceitar fake news. Que foi o motivo principal da sessão na última segunda-feira dia 13 de setembro.

Não existe intenção do Deputado Estadual citado para – abre aspas – “trazer a ideologia de gênero para Minas Gerais”, como foi postado em rede social por um dos membros dessa Casa. A intenção do deputado foi trazer mais uma Política Pública para nos proteger dos preconceitos que sofremos todos os dias. Em tela, a proposta, do ano de 2002, foi redigida para que pessoas jurídicas fossem multadas caso praticassem algum ato em discordância com a personalidade de uma pessoa LGBTQIA+.

Nesta Casa, o projeto de Lei foi totalmente distorcido, infelizmente reduzindo-se a discussão para “uso de banheiros”. Ele é muito mais que o direito de uso ao banheiro. Mas já que tal ponto foi de importância para esta Casa, por mais que esta Comissão não compreenda as competências de uma Câmara Municipal para discutir um projeto de Lei que tramitou na Assembleia Legislativa estadual, ou seja, já aprovado, aguardando ser sancionado pelo poder Executivo estadual, devemos tratar do assunto.

Desde 2002, data do PL, não encontramos nenhuma notícia sobre homens heterossexuais, ou homossexuais, sejam cis ou transgêneros, que forçaram a entrada em banheiros femininos. Frisamos que esta Comissão compreendeu muito bem a preocupação dos Vereadores envolvidos na suposta brecha que a Lei traz. Porém, também entendemos que, como já falado, na distorção da interpretação do PL. Obviamente, que a expressão de gênero de uma pessoa não é simplesmente por sua autodenominação, mas muito mais visível pelo que usa como vestimentas, pelas suas falas, pelo seu comportamento social, enfim, como expressão social da sua personalidade. Há mecanismos, nas Leis federais, como, por exemplo o Código Penal, para proteger pessoas jurídicas de serem multadas por abusos de pessoas que não fazem parte da nossa Comunidade LGBTQIA+. O Judiciário está aí para proteger a todos de pessoas movidas de má-fé.

Muito nos entristeceu a fala de um Vereador que relacionou o PL, uma conquista, com o nojento crime de Pedofilia, previsto na nossa legislação criminal. É vergonhoso que mais uma vez vermos um direito nosso relacionado a este crime repugnante. Exigimos respeito e decoro nas falas dos membros dessa Casa. A Democracia protege nosso Direito intrínseco de liberdade de expressão, mas a liberdade de expressão possui limites. Principalmente o limite de proibir ofensa ao próximo.

E não é essa Comissão quem fala desses limites, é a própria Constituição combinada com várias jurisprudências dos nossos Tribunais Superiores. Não toleramos e estamos exaustos e fartos de falas reacionárias e conservadoras relacionando o crime de Pedofilia justamente quando está em pauta a discussão de direitos LGBTQIA+. Isso se chama HOMOFOBIA, crime desde o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, na nossa tão querida e memorável quinta-feira que foi 13 de junho de 2019.

 

QUARTO PONTO: Respeito às diferenças

A pedagogia de Paulo Freire ajuda a construir a identidade das pessoas, já que estamos falando do processo de educação crítica dos cidadãos e não nos moldes conservadores fracassados. Quando entendemos que existem diferenças culturais e subjetivas, nós formamos jovens mais tolerantes. Esta Comissão não gostaria que estivéssemos aqui, em pleno ano de 2021, no século XXI, da informação e tecnologia, para tratar de um tema tão anacrônico. Se percebêssemos que nossas falas podem ofender o outro, ainda mais em se tratando de postagens em redes sociais, não estaríamos aqui hoje tratando desse tema.

Existem temas muito mais críveis e merecem fiscalização e apreço desta Câmara, como a cobrança indevida e incabível por um serviço de tratamento de esgoto que não existe pela nossa empresa do povo, a Copasa, e a preocupação dos membros da Educação Pública estadual quanto à municipalização das escolas estaduais. Ao invés desta Câmara evadir suas competências para abrir discursão de Projeto de Lei que não tramita nessa Casa, poderiam se preocupar com as demandas urgentes da população de Ubá, porque já está pesando nos nossos bolsos a conta de água e pesará ainda mais a formação educacional da nossa próxima geração, ainda mais daqueles que são vulneráveis economicamente.

 

Por fim, encerramos a nossa importante oportunidade democrática de fala nessa Casa com uma fala importante do Professor Paulo Freire:

 

“Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens educam-se entre si, mediatizados pelo mundo.”

 

Sempre primando pela Diversidade e Educação, nos colocamos à disposição de todos para quaisquer esclarecimentos.

 

Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero da 30.ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil de Minas Gerais”

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Nathan Machado Paschoalino

Advogado, professor e presidente da Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero da 30.ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil de Minas Gerais